Polícia caça grupos que pregam intolerância no Facebook
Por Luis Kawaguti
A polícia de
São Paulo está investigando ao menos dois grupos de jovens que se organizam
para pregar racismo e intolerância no Facebook e competem entre si por
audiência.
Eles são
suspeitos de coordenar cyber attacks contra perfis de figuras públicas, como
ativistas, jornalistas e políticos e também contra fã-clubes de artistas.
Um desses
grupos seria responsável por coordenar a publicação de uma série de comentários
racistas na página do Jornal Nacional, da TV Globo, no mês passado, contra a
jornalista Maria Júlia Coutinho.
Só em 2014,
mais de 86 mil denúncias de racismo e 4,2 mil de homofobia na internet foram
registrados pela SaferNet Brasil, uma organização não governamental que recebe
denúncias de crimes desse tipo, recolhe provas e as repassa para órgãos
policiais.
A grande
quantidade de casos torna praticamente impossível que as autoridades
investiguem cada comentário individual.
A Decradi
(Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância), da Divisão de Proteção
à Pessoa da Polícia Civil de São Paulo, iniciou recentemente uma investigação
para tentar desbaratar dois grandes grupos que atuam de forma coordenada.
A maioria
dos seus organizadores estaria em São Paulo e no Rio de Janeiro.
"Eles
costumam se reunir no Facebook, através de grupos fechados. Divulgam um alvo e
promovem ataques", disse a delegada Daniela Branco, da Decradi.
Segundo ela,
as ações consistem em publicar grande quantidade de mensagens preconceituosas
ou racistas ou "inundar" a página da vítima com imagens de caráter
pornográfico – para que ela seja retirada do ar.
A técnica é
conhecida como "flood" (inundação, em inglês) e não requer grande
conhecimento de informática.
A
investigação ainda está em fase inicial. Até agora, além da agressão a Maria
Júlia Coutinho, a polícia registrou também um ataque contra uma jornalista de
Brasília e investiga possíveis ações contra perfis de políticos e fã-clubes de
músicos.
Brincadeira
de mau gosto?
De acordo
com a delegada, esses grupos começaram a surgir com adolescentes que se
reuniram em páginas privadas do Facebook usando nomes falsos para fazer
"piadas humor negro" – leia-se de conteúdo racista, homofóbico ou
contra portadores de deficiência.
Os
organizadores passaram então a identificar "alvos" para suas ações e
a promover ataques contra perfis do Facebook em horários preestabelecidos.
Segundo a
polícia, eles se sentem estimulados pela repercussão das ações – em termos de
menções na mídia e compartilhamentos nas redes sociais – e chegam a competir
por visibilidade.
De acordo
com o psicólogo Rodrigo Nejm, diretor educacional da organização SaferNet,
práticas semelhantes se popularizaram no Brasil na época das últimas eleições
presidenciais, devido à acirrada divisão política do eleitorado.
Grupos de
militantes abandonaram o debate democrático para discriminar classes sociais e
minorias, além de realizar variados tipos de ataques cibernéticos a páginas de
rivais.
"Ainda
não há uma cultura consolidada (no Brasil) de que na internet nossos direitos e
deveres valem tanto como nas ruas. Grupos que não teriam coragem de fazer isso
(comentários racistas e injuriosos) nas ruas se protegem no suposto anonimato
da internet", disse Nejm.
Porém, o que
inicialmente pode parecer uma atitude sem maiores consequências está virando
caso de polícia.
Punições
"O
adolescente têm na ponta do dedo, no clicar do mouse, poder sobre a reputação e
a honra de alguém, ela pode até mudar o curso da vida de uma pessoa",
disse o advogado Coriolano Almeida Camargo, presidente da Comissão de Direito
Eletrônico e Crimes de Alta Tecnologia da Ordem dos Advogados do Brasil em São
Paulo.
Ele afirmou
que esse tipo de abuso está recebendo cada vez mais atenção das autoridades.
Membros das polícias e do Ministério Público já rastreiam páginas de internet e
redes sociais em busca de abusos e as denúncias crescem.
Segundo ele,
as práticas dos grupos investigados pela Polícia Civil paulista podem ser
classificados como cyber bullying – quando pessoas se unem para realizar atos
que causam dor, angústia e repercussão social.
Dependendo
do teor das publicações, seus autores podem ser indiciados por diferentes
crimes, entre eles injúria ou preconceito – que em casos mais graves podem
render penas de 1 a 3 anos de prisão.
Além disso,
segundo Camargo, a vítima pode dar início a uma ação civil com um pedido de
reparação moral.
De acordo
com a delegada Daniela Branco, no caso de adolescentes que cometam ato
infracional, a Vara da Infância e Juventude pode determinar punições que vão
desde advertências a medidas sócio educativas, ou seja, privação de liberdade.
Segundo ela,
os jovens suspeitos de envolvimento com os dois grupos estão sendo rastreados
com ajuda do Facebook. O fato de terem usado perfis falsos não deve impedir sua
identificação. Eles devem ser chamados para prestar depoimentos.
Fonte:BBC Brasil São Paulo
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